Condomínio: A Assembléia do Espanto
Condomínio: A ASSEMBLÉIA DO
ESPANTO
O que
significa morar em um imóvel tombado pela Prefeitura? É mais ou menos isso aí:
Você compra
uma casa. Quando a casa estiver precisando de alguma reforma, pintura, melhoria,
você não tem direito de mandar fazer o serviço. Precisa pedir permissão a um
terceiro, cumprir uma série de burocracias, esperar o consentimento e ainda
pagar a obra com seu dinheiro.
Depois de
várias visitas ao Patrimônio, acompanhada de algumas moradoras interessadas na
melhoria do condomínio, de posse de todas as informações, fiz algumas reuniões
com os síndicos dos quatro prédios, com o objetivo de conseguirmos
permissão para colocar uma grade ao redor do condomínio. O Patrimônio exigiu
que um arquiteto fizesse o projeto da grade, pago pelos moradores,
evidentemente. Esse projeto seria, depois, levado à Prefeitura para ser
aprovado ou não. Em caso negativo, começar tudo outra vez.
Depois das
reuniões, esperei que cada síndico fizesse reuniões com os respectivos
condôminos. Como isso não aconteceu, resolvi fazer uma assembléia geral. Além
da grade, o objetivo era concorrermos à Lei do Incentivo à Cultura para
ganharmos a reforma total do condomínio, dos quatro prédios, recuperados e
pintados. Como privilégio, os moradores podiam escolher a cor da tinta...
Escrevi a
convocação, citando o assunto a ser debatido, fui a cada um dos prédios e
entreguei a convocação em mãos. Nos apartamentos onde os moradores estavam
fora, trabalhando, joguei a convocação debaixo da porta.
No prédio mais
antigo existem três portarias. Em todos, três andares. No primeiro prédio
visitei dezoito apartamentos, subindo três vezes as escadas. No segundo prédio,
duas portarias, no terceiro, também duas. No quarto prédio entreguei a
convocação apenas à síndica, já que ela não queria participar por ter sua grade
feita antes do tombamento. Haja pernas para subir e descer tantas escadas!
Uma de minhas
vizinhas ofereceu sua sala para a reunião. Achei a sala pequena para um número
tão grande de pessoas, mas ela já havia sido gentil e fiquei agradecida.
Quando entreguei
a convocação ao Jo e sua mãe, esta falou que não ia “mexer com isso”. Respondi
que era importante a participação de todos, mas a escolha era deles.
No dia da
reunião cheguei cedo à sala para acabar de organizar tudo, ver se o número de
cadeiras era suficiente, etc. quando minha vizinha recebeu um telefonema em seu
celular, comunicando que Jo e sua mãe estavam na esquina tentando evitar que os
moradores comparecessem à reunião! E ela havia afirmado que não ia mexer com isso...
As pessoas que
compareceram eram em número muito menor do que eu havia calculado. De repente
entrou um casal desconhecido e se sentou no fundo da sala.
- Somos
advogados! – disseram, mas o tom de voz traduzia mais ou menos isso: somos da
polícia!
- Tudo bem,
falei, podem ficar à vontade.
Antes de
começar a reunião pedi que ouvissem as informações que eu ia passar,
as exigências do Patrimônio para o gradil e a possibilidade de ganharmos a Lei
de Incentivo à Cultura, com a reforma gratuita de todo o condomínio e que no final eu responderia as perguntas.
O casal de
supostos advogados me interrompia a cada palavra que eu tentava dizer. Pareciam
duas crianças em sala de aula perturbando a professora. Mais uma vez pedi que
anotassem as perguntas para não atrapalharem meu raciocínio.
Não adiantou. Continuaram.
A mulher disse que eu havia “obrigado todos a comparecerem aquela assembléia e
isso era contra a lei”. Não me lembrava de ter levado alguém algemado ou
amarrado para aquela sala, mas não queria perder tempo com aqueles absurdos e perguntei:
- Estou contra
a lei?
- Está, a
suposta advogada falou, rindo.
Pelo
pouquíssimo que conheço de advocacia, “todos são inocentes até que se prove o
contrário”. Sou meio impaciente, não costumo medir as palavras, mas não perdi a
elegância.
- A reunião
está interrompida, falei. Saí da sala e fiquei andando no corredor, de um lado
para o outro.
A vizinha do
prédio número quatro, Najla, se levantou e falou com os supostos advogados que
eles não me conheciam, não conheciam meu trabalho no condomínio, que eu era a
pessoa que mais lutava pelos direitos dos moradores. A gritaria começou e
enquanto isso eu me acalmava andando de um lado para o outro, até ser chamada
de volta.
O suposto
advogado me pediu desculpas e, como castigo, sugeri que ele escrevesse a Ata da
Assembléia.
Consegui passar
as informações para todos, mas um morador disse:
- Ninguém quer
essa grade ao redor do condomínio.
Uma moradora
do prédio ao lado, Cristina, arquiteta, sugeriu uma votação; que os favoráveis à grade
levantassem a mão. Todos levantaram as mãos, com duas únicas exceções.
No final da
reunião os moradores do prédio “velho” -
chamado assim por ter sido o primeiro construído no condomínio –
se aproximaram de mim, se apresentaram, mas não quiseram assinar a Ata, temendo
um compromisso. Assinar a Ata significa simplesmente o comparecimento à reunião, independente de aprovar ou reprovar os assuntos tratados.
O advogado voltou a me pedir desculpas e ofereceu seus
préstimos.
Apesar do
aparente sucesso da reunião, a interferência de Jo e sua mãe serviram de
entrave para o sucesso do empreendimento, porque gerou dúvidas e desconfiança nos moradores
que não me conheciam.
E enquanto o IAPI, com cinco mil habitantes ganhou a reforma e pintura de todo o condomínio, continuamos, aqui, com menos de cem habitantes, sendo nomeados "A Favelinha da Cidade Jardim".
Fazer o quê? Chorar ? ou jogar tudo para cima e seguir a maioria: cuidar do próprio umbigo?
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