Vida
de um na ótica do outro.
Diva veio me visitar. Deixei o
computador ligado no corredor e fui para a sala, sentei-me ao seu lado. Ela se lembrou da sogra falecida
e começou a discorrer sobre minha vida.
-
D. Alice gostava muito de você, falou. Ela me disse que uma vez você foi ao
apartamento dela perguntar como se cozinhava arroz e feijão.
Eu? Pedir receita de arroz e feijão com D.
Alice? Meu relacionamento com ela era superficial, nunca fiz isso – pensei.
-
Não me lembro disso – falei.
Diva
continuou:
-
Ela disse que depois disso você saiu de casa, se casou, ficou fora um ano, não
gostou e voltou.
Eu me casei com
quem? Para haver um casamento é preciso que exista um marido...
- Eu não me
casei, falei. Casei agora, com Geraldo. Nunca fui casada antes.
-
Ah, bom, devo ter entendido errado, ela respondeu. Então, você morou com alguém.
-
Sai de casa para ficar sozinha, não morei com ninguém. Sai por causa de Analice. A esquizofrenia dela estava insuportável. Ela se levantava de manhã
falando pornografias e continuava assim, pelo resto do dia. Até que um dia
falei com ela e mamãe: vou embora. As duas tomaram um susto, saíram da cozinha
e se sentaram nas poltronas da sala. Em respeito à doença de minha irmã, minha
mãe se omitia, era incapaz de chamar a atenção dela ou corrigir seus malfeitos
e o ambiente familiar se tornava irrespirável.
Falei
com as duas: - Ainda não fui porque não tinha para onde ir. Aquela manhã a
coisa havia se extrapolado e a decisão tomou conta de mim. Horas depois fui à
cidade e comprei um fogão: tinha apenas uma trempe e um forninho. Sem pés. Maria
me cedeu seu apartamento em Santa Efigênia. Coloquei o fogão em cima de uma
mesa e chamei a companhia de gás para fazer a instalação. Nos dias seguintes ia ao supermercado e
voltava com uma nova planta para colocar na sala. A iluminação era boa e as
plantas cresciam rapidamente. Um ano depois voltei para casa.
-
Não gostou de morar sozinha?
-
Era bom, mas sentia muita solidão. Todo fim de semana eu voltava para cá,
participava do almoço de domingo e depois retornava ao apartamento.
Um
ano depois Maria pediu o apartamento de volta, para alugar. Dei tudo: os sofás,
para minha sobrinha. O fogão deixei lá, no apartamento.
Só
agora, dezenas de anos depois é que tomo conhecimento de que já fui casada, na
visão dos vizinhos... Com um marido sem nome...
Ainda bem que o marido invisível-imaginário era homem...