Narrativas de fatos quotidianos, de pessoas reais, em linguagem de fácil leitura, acessível a todos os leitores, com alguns nomes trocados. Acontecimentos nas vizinhanças, dentro de casa, no consultório e no ambiente de trabalho.
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
terça-feira, 13 de agosto de 2013
Dia dos Pais Tumultuado
Dia dos Pais Tumultuado
Meu marido me ligou do trabalho dizendo que seus filhos queriam lhe dar um presente: uma entrada no Mineirão para o jogo do Cruzeiro e se eu queria ir, para eles comprarem a entrada. Falei sim, embora não entenda o que seja gostar de futebol. Assisto um ou outro jogo na TV quando se trata de jogo do Brasil, Campeonato Mundial, mas dispenso os demais.
- Todos vão caber no carro? – perguntei.
- Sim, são dois carros, vai dar para levar todos – ele respondeu.
Domingo, dia dos pais, enviei uma mensagem via celular ao meu enteado Phillipe, dizendo que queria pagar minha entrada já que o dia era dos pais (e não das madrastas)
O celular começou a tocar e parou antes que eu pudesse atender. Olhei o número: desconhecido. Voltou a tocar e desligar. Quando tocou a quarta vez, e irritantemente desligou, apertei o botão de desligar do celular e resolvi o problema. Silêncio. Nesse meio tempo Phillipe já havia acordado e me enviado sua resposta, que desconheço até hoje, já que o celular estava desligado e a mensagem não chegou.
Meu marido, Geraldo, ligou a TV. Perguntei por que não começava a cozinhar a carne para eu poder fazer o molho à bolonhesa e começar a armar a lasanha, já que Camilla, filha dele, havia dito que queria almoçar cedo. Ele foi para a cozinha quinze minutos depois.
O gás acabou.
Não tenho bujão de reserva porque me recuso a trocar o referido objeto no fogão, por ter recebido um jato de gás gelado nos braços quando tentei fazer isso a primeira vez. Prefiro que o “homem do gás” faça isso. É muito prático: ele traz o bujão e já faz a troca diretamente no fogão e todos ficam felizes.
Geraldo saiu contrariado e foi para o jardim esperar a chegada do caminhão do gás. Geralmente ele chega em trinta minutos, mas o tempo foi passando e... nada. Voltou para o apartamento e tornou a ligar.
O caminhão do gás quebrou.
Peguei meu fogareiro elétrico e continuei a cozinhar a carne moída nele. Quando o “homem do gás” chegou, uma hora e meia depois de ter sido chamado, a carne já estava pronta. Preparei o molho, armei a lasanha e coloquei no forno elétrico, enquanto Geraldo preparava os outros pratos no fogão.
Phillipe havia chegado juntamente com o gás. Chegou de ônibus, sem o carro.
Resolvemos não esperar, já que o almoço saiu bem mais tarde que o planejado. Preparamos a mesa e nos sentamos. O celular tocou: era Camilla, dizendo que não vinha almoçar e que todos se encontrariam no Mineirão.
O carro do namorado quebrou.
Geraldo se aborreceu, novamente, porque teríamos de ir de ônibus. Ele estava preocupado com meu joelho, que havia dado trabalho durante muitos meses, eu havia passado por várias sessões de fisioterapia e estava em recuperação.
- Pode ir, Geraldo, falei, eu fico.
Para falar a verdade, eu não tinha nenhuma vontade de ir e foi com alívio que recebi a notícia da falta dos dois carros. A família é fanática por futebol e não gosto de ser desmancha-prazer.
Acabado o almoço, preparado para oito pessoas e com o comparecimento de três, pai e filho saíram, entusiasmados, para o futebol.
Lavei os pratos, arrumei a cozinha e... cai na cama. Dormi durante uma hora e meia.
Resolvi ir à missa.
A missa daria outra crônica. Comemoração do dia dos pais, parabéns, palmas, etc.
No caminho de volta para casa, meu celular tocou. Era Geraldo, dizendo que havia chegado há muito tempo. A igreja fica a um quarteirão do meu prédio.
Ele contou como foi o futebol.
- O estádio é de primeiro mundo, mas as pessoas, não - falou.
Disse que as cadeiras são fortes, praticamente impossíveis de se quebrar, mas os torcedores se esforçavam para fazer isso. Não se sentavam: todos ficaram em pé em cima das cadeiras e era quase impossível enxergar o campo. Ele olhou as outras cadeiras onde os preços são mais altos e a platéia de nível melhor: todos assistiram ao jogo sentados.
Para piorar, houve empate: 0x0.
segunda-feira, 5 de agosto de 2013
A Colega Esquisita
A Colega Esquisita
-
Tem alguma coisa errada com Magnólia- disse a colega da mesa ao lado, chegando
para trabalhar.
-É, realmente. Sempre que chegamos ela já está lá, sentada, trabalhando,
respondeu a outra.
- Ela chega às sete horas, em ponto, todos os dias. -
Qual é o horário de trabalho, mesmo?
-
É sete horas da manhã, mas todo mundo chega às oito.
-
Realmente, ela não é normal.
-
Também acho. Já viu as folhas que ela digita no computador?
-
Já. Não tem um erro. Termina o trabalho rapidinho. E ainda coloca o texto
formatado. Dava para colocar as folhas que ela digita em quadros e pregar na
parede
-
Pois é. Tem coisa aí
-
E você sabe que depois do expediente ela ainda volta para cá?
-
É mesmo? Para quê?
-
Sei lá... Será que ela quer tomar a chefia?
-
Temos de ficar de olho.
Magnólia
notou os cochichos das colegas, mas continuou seu trabalho até o final do
expediente. Por mais que tentasse, não conseguia aproximação com nenhuma delas.
O relacionamento era superficial. A amizade passava longe. Talvez a diferença
do grau de instrução fosse um empecilho. Saía duas horas antes de todas por exercer
um cargo diferente na seção, com menor remuneração.
Terminado seu horário de trabalho, levantou-se, saiu, foi a um restaurante natural que ficava a dois quarteirões da secretaria. Pediu o prato do dia: arroz integral, legumes e a sobremesa.
Arrependeu-se
à chegada da sobremesa: um copo enorme de frutas variadas cobertas com gelatina
vermelha. E ainda tinha uma porção de cereais cobrindo tudo.
-
Só a sobremesa seria um almoço completo,
pensou, mas comeu assim mesmo e voltou à secretaria.
Entrou
no banheiro.
A
secretaria era cuidadosa com suas repartições. O banheiro estava sempre limpo e
cheirando a eucalipto.
Estava
escovando os dentes quando uma colega entrou no banheiro e riu.
-
já sei o que você veio fazer aqui, depois do expediente, em vez de ir direto
para casa. Está interessada no Robespierre, o novato da seção ao lado, não é?
-
Quem? – Magnólia se espantou.
-
Aquele lá, está arrasando corações, a colega continuou e mostrou o colega,
chegando para o trabalho.
Magnólia
viu o rapaz que entrava na repartição ao lado. Parecia meio lento, bobão e não
entendeu o que havia nele para arrasar o que quer que fosse, cabeças ou
corações, a não ser a novidade da sua condição de novato.
-
Era só o que faltava, pensou.
Olhou
o relógio e suspirou de impaciência, vendo que ainda tinha de esperar uma hora.
Ali perto não havia nada para se distrair, nem uma livraria.
-
E ele sempre se atrasa entre um cliente e
outro, pensou. Fazer o quê?
Penteou
os cabelos, ajeitou a roupa e se encaminhou para as enormes portas da secretaria, sabendo que nos dias seguintes ia
fazer a mesma coisa, até o dentista terminar o lento trabalho em seus dentes.
quinta-feira, 18 de julho de 2013
Faltou uma fitinha colorida
Faltou uma fitinha
colorida
De uns tempos para cá tem acontecido um
comportamento esquisito por parte de alguns taxistas. Vendi meu carro há
alguns anos atrás e passei a andar de táxi, por ser mais econômico e não ter de
procurar vaga para estacionar. Tenho carteira de motorista, conheço bem as leis
de trânsito. As professoras do pré-primário colocavam uma fitinha colorida no braço das crianças para
elas aprenderem a distinguir a mão esquerda da direita. Parece que alguns taxistas estão precisando usar a fitinha...
Da primeira vez peguei um táxi com
minha irmã e falei, logo que entramos na rua, para o motorista parar à esquerda
no final do quarteirão. Ele parou do lado direito. Voltei a dizer que era para
ele parar à esquerda, para podermos descer sem atravessar a rua
-Não posso parar ali porque tem um
caminhão fazendo manobra, ele disse.
-Pedi desde a entrada da rua para parar
à esquerda, falei, mas descemos do carro e atravessamos a rua, para não render
assunto.
Esta semana a coisa se repetiu.
Peguei um táxi em uma rua movimentada.
Fui indicando o caminho.
- Agora o senhor, por favor, entre à
esquerda e pare no segundo quarteirão, também do lado esquerdo.
Ele entrou à esquerda, mas em frente ao
meu prédio, parou do lado direito da rua.
- É para parar do lado esquerdo,
repeti.
- O certo é parar do lado direito, ele
disse, que tem calçada.
- Do lado esquerdo também tem calçada,
respondi.
- É errado parar do lado esquerdo, ele
insistiu.
- Que bobagem! - minha paciência estava
se abalando, mas minha voz continuava calma.
- É mais seguro parar no lado direito,
para a senhora descer na calçada.
Acho que ele estava meio ruim das vistas...
- Mais seguro, como? Se o senhor parar
do lado direito eu vou ter de atravessar esta rua movimentada, sem sinal. Do
lado esquerdo estou no jardim do meu prédio.
Devia ser mais seguro para ele e seu
carro, não para o passageiro.
A argumentação dele não se esgotava e ele
repetia o mesmo, como um disco de vinil rachado.
- Moro aqui há mais de quarenta anos e
todos os táxis param em frente à minha porta, falei.
Finalmente ele parou do lado esquerdo,
em frente ao prédio abaixo do meu. Paguei, entrei no jardim ainda sem entender
a lógica da coisa.
Se a rua fosse de mão dupla, ele teria
razão, mas a rua é de mão única: todos os carros se movimentam na mesma
direção.
segunda-feira, 8 de julho de 2013
Hierarquia animal e humana
Hierarquia animal e humana
Liguei a tv e assisti a um ataque de canguru a um homem. O homem, juntamente com outros membros da família, estava entre os cangurus distribuindo pedaços de pão com os bichos. Ao seu lado o filho, de aproximadamente sete anos de idade. De repente, sem mais nem menos, um canguru que observava tudo, atrás de outro, pula sobre o homem atacando-o. O vídeo se repetiu algumas vezes e pude entender o motivo do ataque.
Desrespeito à hierarquia.
Acredito que o que é do mundo animal é do nosso mundo. Explicando: as naturezas são iguais ou semelhantes. Puro instinto. O motivo das desavenças são o desrespeito à hierarquia. No caso do vídeo o homem alimentava o canguru menor e mais novo. O ataque foi efetuado por um canguru maior e mais velho. Pela hierarquia, o mais velho deveria ter recebido o alimento antes do mais novo. Se o homem conhecesse esta regra, não haveria nenhum conflito e ele poderia ter alimentado os cangurus tranquilamente e passado um dia agradável ao lado do filho e dos outros membros de sua família.
O desconhecimento causou enorme prejuízo: um rosto cortado do queixo à testa e outros estragos na perna e adjacências, que não puderam ser mostradas na tv.
Aconteceu o mesmo quando um casal de idosos, que criava um chimpanzé, entregou o animal a um zoológico. Em uma visita, o casal alimentou o chimpanzé quando o homem foi atacado por outro que quase o matou. O motivo? Desrespeito à hierarquia. O chimpanzé que atacou o idoso pertencia a uma classe mais dominante que o animal de estimação criado por ele. Os tais de alfa, beta e delta. Os mais fortes, mais inteligentes, os macacos alfa, são respeitados pelo bando e se alimentam em primeiro lugar. Depois disso, os beta e delta podem se alimentar tranquilamente. O casal de idosos desconhecia esta regra e o marido sofreu, quase pagando pela vida, pela falta de informação.
A regra se repete nas brigas dos animais domésticos. O gato antigo da casa, que agride o novato, o cão mais velho que brinca com o cachorrinho recém chegado mas, que o mata quando o dono joga um pedaço de carne para o pequenino.
O mesmo acontece entre os humanos. Quando os filhos começam a ditar ordens na casa, principalmente na adolescência, regidos pelos hormônios e os pais se submetem, com medo de perder o amor dos filhos. A hierarquia é desobedecida e a infelicidade se instala, para todos, inclusive para os que tomaram as rédeas da casa. O adolescente, apesar do comportamento autoritário, se torna desamparado e perdido, porque ele precisa sentir que os pais são mais fortes do que ele e tem poder para ampará-lo e conduzi-lo.
Os pais tem o direito de exigir que os filhos cumpram as regras da casa. Não é bom que os pais se sintam mal dentro do lar que construíram, por causa da interferência e exigência dos filhos adolescentes. O risco de perder o amor dos filhos, não acontece. Ao contrário, quando aprenderem a fazer isso, ganham algo além do amor: respeito.
segunda-feira, 17 de junho de 2013
Condomínio: As Abelhas Desnorteadas
Condomínio: As Abelhas Desnorteadas
Eu era síndica do meu prédio. O condomínio consiste em quatro prédios de três andares, cada um com seu síndico. Chegando a casa, voltando do trabalho, notei algumas abelhas voando ao redor das lâmpadas externas de cada portaria. De manhã o chão estava coalhado de abelhas mortas. Peguei a vassoura e varri, para abrir passagem para os moradores que estudavam e trabalhavam pela manhã.
Toda tarde acontecia o mesmo: as abelhas surgiam e ficavam voando ao redor das lâmpadas. Os moradores estavam preocupados com o risco de alguma ferroada. De onde elas vinham?
Fomos investigando até descobrir que elas saiam do telhado do prédio vizinho, ao lado do nosso. Telefonei para o síndico.
- As abelhas não incomodam os moradores daqui – ele disse. - Se estão incomodando vocês, as abelhas são suas.
Levei alguns segundos para esperar que meu queixo caído voltasse à posição normal.
- Sr. Rubirosa, falei, se as abelhas são nossas, elas estão no telhado do seu prédio. Os trabalhadores vão precisar subir no seu telhado para retirar a colméia.
Ele ficou aborrecido com o que eu falei e respondeu que pagaria metade do serviço. Aqui nos prédios sempre surge alguém com esse tipo de lógica, mas como nunca tive paciência para conversas compridas nem desejava criar atrito com vizinhos, acabei concordando.
Fui para as páginas amarelas procurar um abelheiro – ou abelhudo? Alguns moradores me auxiliaram com informações úteis. É contra a lei matar abelhas, mas os homens encarregados da tarefa apareceram. Combinei o serviço com eles, o preço e deixei os detalhes por conta deles.
No dia seguinte vi os homens com aquelas vestimentas brancas, o rosto coberto por véus ou algo semelhante, andando em cima do telhado do prédio vizinho, cuidando das abelhas. O problema foi resolvido.
O Sr. Rubirosa apareceu na manhã seguinte, trazendo sua parte do pagamento, visivelmente contrariado, ainda se sentindo lesado...
Vá entender!
domingo, 2 de junho de 2013
O frango assado e o cobertor
O frango assado
e o cobertor
- Tenho
vergonha ao me lembrar daquela época – disse Esmeralda, parecendo uma
adolescente.
-
Contar pode servir para exorcizar os demônios interiores – falei.
- Ele
era casado...- ela começou.
-
Casado? – perguntei.
- A
solidão me empurrou para os braços de um homem casado. Eu acordava antes das
seis horas da manhã, tomava banho, preparava o café e saia para trabalhar. Para
minha surpresa, ele já estava com o carro estacionado à minha porta, para me
dar uma carona até meu local de trabalho: uma verdadeira viagem, tão longe era
da minha casa. Eu não o amava, mas fui me enredando e perdi a virgindade depois
de seis meses. Havia aquele conflito de prazer, culpa, não era aquilo que eu
queria, vergonha, o que eu faço agora, como sair disso, o que vai ser de mim...
Uma
noite, em um de nossos encontros, dentro do carro, ele me trouxe um frango
assado. Falou que havia comprado um frango assado para a família dele e
resolveu levar um para mim também. Se ele me trouxesse alguma coisa pequena
seria melhor e mais fácil. Algumas empadinhas, um ou dois pães de queijo, algum
salgadinho a ser consumido ali, no momento. Mas não, ele tinha de me trazer um
frango assado.
Cheguei
em casa com aquilo, depois das 23h, coloquei em cima da mesa e meus pais
estranharam. Nem me lembro o que falei, que explicação dei para aquele frango
surgido à noite de qual supermercado... só me lembro da sensação de mal estar
que experimentei ao colocar aquilo em cima da mesa.
Tempos
depois ele disse que queria me dar um presente e me perguntou o que eu queria.
Falei que estava precisando de um pijama.
Ao
voltar do trabalho encontrei um embrulho grande em cima da minha cama.
Perguntei o que era aquilo e minha mãe falou que um rapazinho havia trazido
para mim. Devia ser o empregado que trabalhava para ele, fazendo pequenos
serviços.
Abri o
embrulho e me deparei com um cobertor. Sentei-me na cama e chorei. Chorei de
soluçar, por muito tempo. Aquele cobertor dizia: eu sou casado. Um solteiro, um
namorado, jamais daria de presente um frango assado ou um cobertor à namorada.
Chorei de vergonha, de ter de manter aparências, de lutar para fugir da língua
da vizinhança, de levar uma vida dupla quando o que eu queria era apenas um
marido, filhos, uma casa. E não ia ter nada daquilo com aquele companheiro. O
que ele pensava? Que eu ia dormir nua, na casa de meus pais e me cobrir com o
cobertor? E se precisasse ir ao banheiro à noite? Iria enrolada no cobertor?
Chorei
muito tempo. Depois de me acalmar telefonei para ele – era um telefone
comunitário, onde outra pessoa atendia e depois o chamava. Falei que um
embrulho dele havia parado por engano na minha casa, que aquilo não era para
mim, era para a esposa dele. Ele resmungou alguma coisa e mandou o rapazinho à
minha casa pegar de volta. Disse que o pijama era muito barato e resolveu me
dar o cobertor, por ser um artigo mais caro... Depois disse que eu não sabia
agradecer um presente.
Dias
depois fui a uma loja e comprei o pijama.
- E como
você resolveu essa situação? – perguntei.
- Foi
um comentário que ele fez. Estávamos no carro dele, ele olhava pensativo para
frente e comentou que o destino dele era duplo.
- Duplo? – perguntei.
- Ele
estava satisfeito com nós duas e queria continuar assim. Foi como um tapa na
cara. Eu não ficaria com ele nem que se separasse da esposa. Era bruto e machão.
Meses depois dei fim àquela história.
Antes
que eu pudesse dizer alguma coisa, Esmeralda se levantou, caminhou para a porta
e saiu.
sábado, 27 de abril de 2013
As violetas escondem as flores?
As Violetas Escondem as Flores?
-As violetas escondem as flores. – disse meu pai.
Dias depois, assistindo a um programa
na TV, em uma reportagem sobre violetas, mostraram uma série delas, de todas as
cores. As folhas, em nível mais baixo e as flores, acima das folhas, em tons
rosa, azul, branco, violeta. Chamei meu pai para ver. Ele olhou para a imagem e
concluiu;
- É... as violetas escondem as
flores.
Fiquei
olhando as violetas e suas cores... Escondem as flores, como? Elas não estavam
ali, à vista, com toda sua beleza?
As pessoas são assim, quando
acreditam em uma coisa, podemos mostrar fotos, ao vivo, filmes, depoimentos,
desenhos ou sinais de fumaça, que a idéia ainda continua arraigada. Como aconteceu
com o encantador de cavalos.
Ele via o
pai espancando cavalos para domá-los. Criança, ainda, sensível ao sofrimento do
animal, começou a criar um novo método de domesticação. Aprendeu a linguagem
corporal do cavalo e a se comunicar com ele, através de gestos.
Finalmente,
domou seu primeiro cavalo. Orgulhoso, chamou o pai para ver.
O pai viu
aquilo, ficou feliz ao descobrir que havia um método melhor do que o seu,
abraçou o filho e viveram felizes para sempre? Doce ilusão...
A realidade é diferente dos sonho: O pai ficou
furioso, pegou uma correia e fez com o filho o que já fazia com os cavalos. Quem
era aquele moleque para dizer que sabia mais do que seu pai? Como o pai ia
reconhecer que tinha sido cruel sem necessidade, que havia falhado em todos
aqueles anos de experiência e prática?
Se o pai se
esqueceu da surra que deu no filho, este jamais se esqueceu. Quem sofre os
golpes jamais esquece, mas ele soube transformar o limão em uma limonada. Tornou-se
um grande domador de cavalos e especializou-se na profissão, foi reconhecido no
mundo inteiro, imortalizado em filmes e livros.
Um belo exemplo.
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013
Condomínio: A Assembléia do Espanto
Condomínio: A ASSEMBLÉIA DO ESPANTO
O que significa morar em um imóvel tombado pela Prefeitura? É mais ou menos isso aí:
Você compra uma casa. Quando a casa estiver precisando de alguma reforma, pintura, melhoria, você não tem direito de mandar fazer o serviço. Precisa pedir permissão a um terceiro, cumprir uma série de burocracias, esperar o consentimento e ainda pagar a obra com seu dinheiro.
Depois de várias visitas ao Patrimônio, acompanhada de algumas moradoras interessadas na melhoria do condomínio, de posse de todas as informações, fiz algumas reuniões com os síndicos dos quatro prédios, com o objetivo de conseguirmos permissão para colocar uma grade ao redor do condomínio. O Patrimônio exigiu que um arquiteto fizesse o projeto da grade, pago pelos moradores, evidentemente. Esse projeto seria, depois, levado à Prefeitura para ser aprovado ou não. Em caso negativo, começar tudo outra vez.
Depois das reuniões, esperei que cada síndico fizesse reuniões com os respectivos condôminos. Como isso não aconteceu, resolvi fazer uma assembléia geral. Além da grade, o objetivo era concorrermos à Lei do Incentivo à Cultura para ganharmos a reforma total do condomínio, dos quatro prédios, recuperados e pintados. Como privilégio, os moradores podiam escolher a cor da tinta...
Escrevi a convocação, citando o assunto a ser debatido, fui a cada um dos prédios e entreguei a convocação em mãos. Nos apartamentos onde os moradores estavam fora, trabalhando, joguei a convocação debaixo da porta.
No prédio mais antigo existem três portarias. Em todos, três andares. No primeiro prédio visitei dezoito apartamentos, subindo três vezes as escadas. No segundo prédio, duas portarias, no terceiro, também duas. No quarto prédio entreguei a convocação apenas à síndica, já que ela não queria participar por ter sua grade feita antes do tombamento. Haja pernas para subir e descer tantas escadas!
Uma de minhas vizinhas ofereceu sua sala para a reunião. Achei a sala pequena para um número tão grande de pessoas, mas ela já havia sido gentil e fiquei agradecida.
Quando entreguei a convocação ao Jo e sua mãe, esta falou que não ia “mexer com isso”. Respondi que era importante a participação de todos, mas a escolha era deles.
No dia da reunião cheguei cedo à sala para acabar de organizar tudo, ver se o número de cadeiras era suficiente, etc. quando minha vizinha recebeu um telefonema em seu celular, comunicando que Jo e sua mãe estavam na esquina tentando evitar que os moradores comparecessem à reunião! E ela havia afirmado que não ia mexer com isso...
As pessoas que compareceram eram em número muito menor do que eu havia calculado. De repente entrou um casal desconhecido e se sentou no fundo da sala.
- Somos advogados! – disseram, mas o tom de voz traduzia mais ou menos isso: somos da polícia!
- Tudo bem, falei, podem ficar à vontade.
Antes de começar a reunião pedi que ouvissem as informações que eu ia passar, as exigências do Patrimônio para o gradil e a possibilidade de ganharmos a Lei de Incentivo à Cultura, com a reforma gratuita de todo o condomínio e que no final eu responderia as perguntas.
O casal de supostos advogados me interrompia a cada palavra que eu tentava dizer. Pareciam duas crianças em sala de aula perturbando a professora. Mais uma vez pedi que anotassem as perguntas para não atrapalharem meu raciocínio.
Não adiantou. Continuaram. A mulher disse que eu havia “obrigado todos a comparecerem aquela assembléia e isso era contra a lei”. Não me lembrava de ter levado alguém algemado ou amarrado para aquela sala, mas não queria perder tempo com aqueles absurdos e perguntei:
- Estou contra a lei?
- Está, a suposta advogada falou, rindo.
Pelo pouquíssimo que conheço de advocacia, “todos são inocentes até que se prove o contrário”. Sou meio impaciente, não costumo medir as palavras, mas não perdi a elegância.
- A reunião está interrompida, falei. Saí da sala e fiquei andando no corredor, de um lado para o outro.
A vizinha do prédio número quatro, Najla, se levantou e falou com os supostos advogados que eles não me conheciam, não conheciam meu trabalho no condomínio, que eu era a pessoa que mais lutava pelos direitos dos moradores. A gritaria começou e enquanto isso eu me acalmava andando de um lado para o outro, até ser chamada de volta.
O suposto advogado me pediu desculpas e, como castigo, sugeri que ele escrevesse a Ata da Assembléia.
Consegui passar as informações para todos, mas um morador disse:
- Ninguém quer essa grade ao redor do condomínio.
Uma moradora do prédio ao lado, Cristina, arquiteta, sugeriu uma votação; que os favoráveis à grade levantassem a mão. Todos levantaram as mãos, com duas únicas exceções.
No final da reunião os moradores do prédio “velho” - chamado assim por ter sido o primeiro construído no condomínio – se aproximaram de mim, se apresentaram, mas não quiseram assinar a Ata, temendo um compromisso. Assinar a Ata significa simplesmente o comparecimento à reunião, independente de aprovar ou reprovar os assuntos tratados.
O advogado voltou a me pedir desculpas e ofereceu seus préstimos.
Apesar do aparente sucesso da reunião, a interferência de Jo e sua mãe serviram de entrave para o sucesso do empreendimento, porque gerou dúvidas e desconfiança nos moradores que não me conheciam.
E enquanto o IAPI, com cinco mil habitantes ganhou a reforma e pintura de todo o condomínio, continuamos, aqui, com menos de cem habitantes, sendo nomeados "A Favelinha da Cidade Jardim".
Fazer o quê? Chorar ? ou jogar tudo para cima e seguir a maioria: cuidar do próprio umbigo?
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