quarta-feira, 19 de setembro de 2012

cap 4 Secretaria: Fantasmas do casarão

Fantasmas do Casarão

          A Secretaria mudou de endereço e se transferiu para a Praça da Liberdade. A diretoria onde eu trabalhava ocupou o primeiro andar, dividida em várias salas e eu fui trabalhar no Arquivo, no porão, ambiente considerado insalubre por causa da papelada antiga e empoeirada, documentos do pessoal inativo, que selecionávamos e organizávamos para a microfilmagem.
          Minha colega mais velha, de setenta anos, Marisa, muito considerada e respeitada no setor, entregou-me uma chave para eu fechar minhas gavetas.
          - Para que isso? – perguntei. Não tenho nada que precise ser fechado.
          Rindo, ela me entregou duas pastas usadas, com folhas em branco que eu poderia usar para anotações. Todas usavam chaves em suas gavetas.
          Dias depois, não me lembro a razão, precisei faltar ao serviço. Quando retornei encontrei minhas gavetas arrombadas. O fundo de uma delas ficou solto depois do arrombamento. Perguntei quem havia feito aquilo.
          - Foi o novo diretor, elas responderam. O nosso diretor era novato na seção. Algumas ficaram rindo maliciosamente. Fiquei me perguntando a razão daquilo.
          Em cada sala havia dezenas de pessoas. No meu setor, na parte da manhã mais de uma dúzia. À tarde, outra dúzia. Na sala ao lado, a mesma quantidade de gente, sem contar as outras salas. O diretor havia saído de sua sala, andou alguns metros, atravessou o pátio, desceu um lance de escadas, entrou no Arquivo e perguntou onde era minha mesa. Por que eu, no meio de dezenas e dezenas de pessoas? Por que foi lá justamente no dia em que eu estava ausente? Se eu tentava me manter o mais invisível possível dentro da Secretaria...
          Ele encontrou as duas pastas em branco e um artigo sobre psicologia.
          - Pelo menos ele leu o artigo? - perguntei - Talvez tenha aprendido alguma coisa.
          Meses antes da posse dele a coordenadora da minha seção comentou comigo que a única pessoa que poderia ocupar a chefia seria eu, por ser a única no setor a ter curso superior. Eu jamais ambicionei ocupar um cargo de chefia porque não me interessava por serviço burocrático, embora fizesse minhas tarefas com boa vontade.
          Peguei a chave e coloquei no lugar devido: a lata de lixo e deixei as gavetas, ou o que sobrou delas, abertas.
          Se isso acontecesse hoje, eu iria à sala dele e perguntaria o que ele estava procurando em minha mesa, o que eu poderia fazer para ajudá-lo. Isso também seria um pouco difícil, porque ele aparecia lá de vez em quando. Quem fazia todo o serviço dele era sua assistente.
          Havia um fantasma rondando o casarão: chamava-se Paranóia e era alimentado por maledicências: Ele foi lá movido a fofocas.
          Sua assistente era seu braço direito, resolvia todos os seus problemas, era sua melhor amiga...
          Meses depois a assistente ocupou o cargo de diretora em seu lugar e ele teve de se retirar.

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