Para Tião Martins ou A Inveja do Pênis

Para Tião Martins ou A Inveja do Pênis

 

            Estava assistindo pela enésima vez uma das aulas do curso de Psicologia onde a professora falava daquela teoria de Freud que afirma ter a mulher inveja do pênis. Fui perdendo a paciência até fazer um comentário em voz baixa que fez meu colega da frente olhar para trás procurando quem disse aquilo e dar uma gargalhada. Minha irmã, rindo, sentada ao meu lado, fez um movimento circular com o dedo perto da cabeça indicando que eu era biruta ou lelé da cuca.

            Meu comentário foi o seguinte;

            - Estou cansada de ouvir essa professora dizer que as mulheres têm inveja do pênis. Claro que eu quero um pênis! – e acrescentei - Mas não é desse jeito!

            Aquela impaciência retornou quando li um artigo de Tião Martins que mencionava a mesma teoria: leio todas as crônicas, devoro cada uma como uma sobremesa gostosa. Algumas me fazem rir, outras, pensar. Mas quando a velha teoria voltou a ser afirmada como verdade universal, fiquei, mais uma vez, indignada. Nem sei em qual revista foi publicada, esqueci a data, mas o incômodo ficou, como uma pedrinha no sapato.

            Acredito que a maioria das mulheres (normais, heterossexuais) quer um pênis, mas não anatomicamente, pregado em seu corpo. Se ela sente atração por homens, o que iria fazer com aquele apêndice?  Sou mulher há muito tempo e não me lembro de uma vez sequer, em minha trajetória de vida ter desejado tal apetrecho anatômico. Também não conheci nenhuma mulher que o quisesse em seu corpo. Elas querem a parte de cima, com a qual já nasceram: seios grandes e fartos ou se já os tem, seios pequenos. Desejei, sim o dono dele,  mesmo quando tais desejos eram negados e combatidos pela sociedade há alguns anos atrás.

            Outra pergunta ainda teima em surgir: Como é que um homem pode saber o que uma mulher deseja?Ainda mais naqueles tempos de Freud onde a repressão sexual era violenta, tão combatida que as mulheres nem sabiam porque suspiravam diante de algum elemento do sexo oposto que passasse a metros de distância, visto de sua janela, escondidas atrás de cortinas de renda...

            O único homem que tinha alma feminina já morreu. Chamava-se Jorge Amado. Sabia dizer o que uma mulher sentia. Ainda me lembro de uma página sua, de um romance onde a heroína havia feito um aborto. Ele descreveu os sentimentos dela e fiquei ali, abismada, de queixo caído: como é que ele sabia? Nunca fiz um aborto mas posso imaginar que os sentimentos eram aqueles. Surpreendente.

            Uma teoria que o grande mestre criou e a maioria aceita como verdadeira. Tiraria o chapéu para Freud, se tivesse um, por causa de seu brilhantismo em outras teorias, mas essa aí, não, por uma razão muito simples: sou mulher, conheço mulher e posso afirmar que é falsa. Acredito o contrário, mas por razões óbvias também não posso afirmar: que o homem, sim, tem inveja do pênis. As razões são diversas: tamanho, maneira de funcionar, maior competência do concorrente, etc.

             Tião Martins, continuo lendo todas as suas crônicas, sempre que uma me cai nas mãos.